sexta-feira, 18 de julho de 2014

Machismo e homo-transfobia: as doenças sociais que precisam ser remediadas

por Frederico Oliveira


É muito comum as manifestações difamatórias dos movimentos feministas e LGBT, difundidas por formadores de opinião altamente conservadores, além dos fundamentalistas religiosos que tanto reforçam estereótipos, aumentando o preconceito e a discriminação a essa parcela da população.

Tenho lido certas bobagens que poluem as mídias de modo geral, especialmente os artigos publicados  por um trio de colunistas de uma certa revista semanal, o que especificamente me moveu a fazer algumas reflexões.

O certo é que enquanto houver pessoas reforçando os estereótipos, ou que insistem em afirmar a cultura de inferiorização das mulheres, dos gays, lésbicas, travestis e transexuais, os movimentos de luta pelo reconhecimento e pela afirmação dos direitos e das liberdades desses grupos devem, portanto, existir em quanto movimento de luta por reconhecimento e serem atuantes no combate ao preconceito e a discriminação.

Não entre nessa paranoia burra de que o movimento feminista e o movimento LGBT tem por objetivo travar  uma guerra contra homens, a masculinidade ou contra os heterossexuais. Vamos pensar antes de aceitar certas opiniões desconectadas da realidade, escritas inclusive por pessoas que sabe lá por que cargas d’água conquistaram espaço na mídia e, pra piorar são remunerados pra escrever tamanhos absurdos. 

Primeiramente é importante ressaltar, como alguém pode escrever sobre um assunto sem no mínimo estudar sobre ele? Sem no mínimo enfrentar o contexto histórico? Sem no mínimo avaliar a responsabilidade sobre o que se escreve e os sérios prejuízos de se insistir na violência contra grupos que possuem desvantagens sociais de que não precisa fazer muito esforço para percebê-las?

Ora ora é no mínimo de má-fé dizer que o movimento feminista e que os movimentos LGBT tem por finalidade a busca de privilégios. Toda vez que ouço isso tenho uma vontade de gritar de esbravejar, mas procuro parar, respirar e manter o equilíbrio para não ser intolerante, o que todos nós precisamos tanto exercitar, afinal de contas esse é o ônus da democracia. Obviamente que há limites entre liberdade de expressão e liberdade de opressão, garantindo-se na segunda hipótese o direito de resposta e a respectiva reparação dos prejuízos. 

Privilégio?

Parece estranho, mas a gente tem que ter o trabalho de explicar o óbvio para que os ignorantes de plantão nao aceitem essas bobagens escritas em canais de uma revista que pode ser comprada em qualquer esquina em todas as bancas do país.

O que eles querem, de uma a duas: 1 - legitimar a opressão do machismo que inferioriza as mulheres em detrimento dos homens ou legitimar a cultura de se condenar as pessoas LGBT; ou 2 – a conquista de mais holofote e de mais adeptos de um conservadorismo insano e irracional.

Criar polêmica desarrazoada no afã de obter mais holofote, vem sendo uma tática muito usada pelos conservadores. 

Parece coisa de gente doida, mas como é possível pensar em privilégio, enquanto as pesquisas sérias demonstram suficientemente que as mulheres estão em desvantagem com relação aos homens?

Vamos então aos dados que revelam as desvantagens sociais de ser mulher e de ser LGBT nesse país.

No cenário mundial o Brasil está em 156º lugar no que se refere a presença de mulheres no Legislativo. Nesse pleito eleitoral que se encerra esse ano, dos 513 deputados federais eleitos, apenas 45 são mulheres, ou seja apenas 9% das cadeiras são femininas. No Senado Federal, apenas 13 % dos parlamentares são mulheres. No Judiciário brasileiro, apesar estar mais equilibrado em razão do critério de ingresso ser o concurso público, também é fácil perceber as desvantagens das mulheres perante os homens conforme revelou a pesquisa feita pelo CNJ (Conselho Nacional do Judiciário): 64% dos magistrados são homens e 82% das vagas são masculinas, nos tribunais superiores, cujo critério de ingresso é por indicação do poder Executivo. Dessas mulheres 30,2% já sofreram algum tipo de reação negativa pela sua condição feminina. (fonte: Folha de S. Paulo

Não bastasse isso, pesquisas revelam que a cada minuto 5 minutos uma mulher é vítima da violência doméstica além da lamentável realidade de preconceito fruto do machismo que também é levado para o mercado de trabalho que as remuneram com salários inferiores aos dos homens, mesmo estando elas mais preparadas profissionalmente tecnicamente. De acordo com o IBGE quanto mais elevado o grau de escolaridade das mulheres mercado de trabalho, maior é a diferença salarial. 

Com relação aos LGBT a violência também é absurda. Ano passado foi contabilizada a morte de 312 LGBT, na maioria travestis e transexuais que sofrem rejeição desde a infância por suas próprias famílias, na escola e que tem como único espaço o escuro das ruas e a prostituição como forma de sobrevivência. A expectativa de vida de travestis e transexuais é 30 anos de idade quando muito. Como já escrevi aqui por diversas vezes, os dados revelam a violência psicológica sofrida por essa população vítima desde  a convivência familiar até o assédio moral no mercado de trabalho tudo em razão do não enquadramento ao padrão social heteronormativo, construído na falsa ideia de que o certo é ser heterossexual em menosprezo a realidade da orientação homossexual e identidades de gênero. 

Ora como é possível que a mídia, por mais conservadora que seja, possa ser conivente com os absurdos escritos por esses colunistas que insistem em deslegitimar o movimento feminista e os movimentos representativos da população LGBT.

É preciso enteder de uma vez por todas que a luta feminista não é para se garantir superioridade para as mulheres, assim como a luta LGBT não é para se garantir superioridade de gays e lésbicas.

Ninguém em sã consciência quer impor que o mundo seja gay, isso seria um desrespeito quanto a liberdade e o direito de se afirmar a condição da maioria heterossexual e de se constituir família adequada a esse modelo.  Também do mesmo modo, o feminismo não quer tomar o lugar opressor do homem, quer apenas oportunidades e direitos mais iguais. 

O que se busca por esses movimentos de combate ao machismo e ao padrão heteronormativo é a liberdade e nao a opressão a nenhum padrão, seja ele um ou outro.

Também não se busca retirar as mulheres que livremente optaram por ter uma vida de Amélia, de cuidar dos filhos e de ser prendada no lar. Ora seria eu contra minha avó, minha tia? Minha mãe cozinha para toda a família que é uma maravilha, tenho amigas que optaram em casar e se dedicar exclusivamente aos cuidados dos filhos e dos afazeres domésticos e estão felizes nessa condição. O que importa é que nao haja nenhuma forma de violência ou condicionamento exclusivo para que a mulher ocupe espaço limitado e cheio de grades na sociedade.

O que se quer é arrancar pessoas da paralisante opressão que as impedem de ser aquilo que elas realmente querem ser.

A luta é para acabar de vez com a cultura machista que tem por intenção o direito do homem sentar com seu bundão no sofá, ficar coçando o saco enquanto a mulher se descabela sozinha pra cuidar dos filhos e dos afazeres domésticos. Por que não estabelecer um equilíbrio na divisão das funções domésticas? Por que não ambos dividirem funções nos cuidados com os filhos?

A luta do movimento feminista é de combate a violência machista que mata e aprisiona milhares de mulheres pelo mundo em maior ou menor grau.

A luta do movimento LGBT é de combate à cultura heteronormativa que desqualifica a orientação homossexual e violenta de maneira perversa e aviltante a condição das travestis e transexuais, como o grupo social mais difamado nessa sociedade brasileira ainda tão preconceituosa.

A pretensão desses movimentos é lutar pelo que realmente importa, o que se busca é que as pessoas sejam consideradas simplesmente por serem seres humanos e nao por sua orientação sexual ou identidade de gênero.

No entanto, enquanto existir pessoas ignorantes que desconhecem a realidade a respeito da sexualidade humana, que ainda nao compreenderam que gênero é uma construção social histórica e não um fator biológico determinante de comportamento e expressões; enquanto houver pessoas que desconhecem a realidade a respeito da homossexualidade, e da condição das travestis e transexuais, os movimentos feministas e LGBTs  devem ter espaço importante para desconstruir tamanhos absurdos que tanto estampam e poluem as páginas da internet e algumas revistas e canais de televisão no Brasil afora. Do mesmo modo, políticas públicas afirmativas de combate ao preconceito e a discriminação também devem ser adotadas como mecanismo de força para impor uma cultura de  reconhecimento, respeito e tolerância. 

Leio esse tipo de campanha difamatória apenas pra saber o que certas pessoas estão pensando sobre um assunto que tanto me interessa no combate a todas as formas de discriminação e preconceito.

Dá embrulho no estomago,  náuseas!

Enquanto insistirem em deslegitimar uma condição social que é realidade e que merece respeito, reforçando os preconceitos já tão arraigados na mentalidade de nossa sociedade, tais movimentos atuarão fiscalizando e denunciando, nao porque são contra heterossexuais ou porque são contra a masculinidade.

Essa lógica de perseguição parece se repetir. Afinal de contas no passado tínhamos movimentos abolicionistas constantemente perseguidos e difamados por esse tipo de imprensa. Basta saber, de que lado você está!

É preciso ser contra as correntes opressoras do machismo e da homofobia, as grandes doenças sociais que precisam ser remediadas. Enquanto essa doença inflamar os rincões desse nosso país, estaremos no combate, no combate legítimo adqueado à moldura constitucional para a concretização de uma sociedade FRATERNA, JUSTA, PLURALISTA e SEM PRECONCEITOS.



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