domingo, 28 de junho de 2015

O orgulho LGBT: a luta por reconhecimento

por Frederico Oliveira
republicado e editado

No dia 28 de junho comemora-se o dia mundial do Orgulho LGBT, em celebração à revolta de Stonewall, que se deu por uma série de episódios de enfrentamento da comunidade LGBT à opressão e a violência policial em 1969, na cidade de Nova Iorque. A data marcada pela resistência é uma oportunidade para refletir a luta pelo reconhecimento e o orgulho de ser lésbica, gay, bissexual, travesti e transexual

Mas por que ter orgulho de ser LGBT? 

A "luta por reconhecimento" parte da necessidade de romper a pecha de preconceito e a estigmatização sentida pelas pessoas LGBTs impedidas de exercitar livremente a sua cidadania. 


Infelizmente, a sociedade desconhece a diversidade sexual e de gênero composta de atributos que não correspondem aos padrões historicamente impostos, criados para determinar uma relação hierárquica de poder do gênero masculino (machismo/sexismo) sobre o feminino e orientações sexuais e identidades de gênero desviantes que não correspondem ao padrão denominado heteronormativo. Esse raciocínio é suficiente para determinar a equivocada compreensão de que é errado ser homossexual ou transgênero. 

Mas quem disse que o certo é atender equivocados padrões pré-definidos que não correspondem às necessidades e aos anseios daqueles que não se encaixarão nesses padrões para serem felizes?

Ser lésbica, gay, bissexual, travesti ou transexual é transgredir com a heteronormatividade compulsória de rígidos padrões  injustamente estabelecidos pela sociedade. 

Ser lésbica, gay, bissexual, travesti ou transexual é encarar as constantes  humilhações carregadas desde a infância e conseguir ser gente grande sem ter a vergonha de ser feliz. 

Ser lésbica, gay, bissexual, travesti ou transexual é enfrentar o medo, a vergonha, o escárnio, a estigmatização, a demonização, o terror, a indiferença para se impor e dizer aqui estou, sou gente e por ser gente quero contribuir e ser aceito nessa vida em sociedade. 

Ser lésbica, gay, bissexual, travesti ou transexual é sair de um armário e dos guetos fruto da opressão e do medo e responder pra sociedade que esse traço diferente da sua sexualidade e da sua identidade de gênero não deprecia em nada a sua reputação, o seu caráter e a sua dignidade.

O orgulho LGBT é fruto da busca de ampliação de direitos decorrentes do sentimento coletivo das injustiças sofridas dessa equivocada imposição de uma cultura heteronormativa. 

As pessoas LGBTs lutam pelo reconhecimento e visibilidade como forma de arrancá-los da situação paralisante do rebaixamento, para que possam integrar-se na sociedade livres das amarras que obstaculizam a fruição de seus direitos e liberdades fundamentais. 

Como menciona o filósofo e sociólogo alemão Axel Honneth, "os indivíduos precisam se saber reconhecidos também em suas capacidades e propriedades particulares para estar em condições de autorrealização, eles necessitam de uma estima social que só pode se dar na base de finalidades partilhadas em comum" (Luta por reconhecimento)

Ser lésbica, gay, bissexual, travesti ou transexual é combater a "usurpação negativa" dirigida às suas particularidades e mesmo assim orgulhar-se de sua condição humana, enfrentando de cabeça erguida a hostilidade de uma sociedade que vive na sombra do véu de uma ignorância ditada pelos estereótipos construídos por uma cultura heteronormativa falaciosa e opressora.

Como cantou Gonzaguinha vamos então "viver e não ter a vergonha de ser feliz". 

E viva as cores do arco-íris que celebra a convivência pacífica e harmoniosa da diversidade sexual e de gênero. Afinal de contas, a natureza não é preto-e-branca, mas multicolorida.

Revolta de StoneWall, Nova Iorque 28/06/1969

quarta-feira, 24 de junho de 2015

SBS "considera preocupante a supressão de gênero e orientação sexual nos planos de educação"

por Frederico Oliveira. 

A Sociedade Brasileira de Sociologia (SBS) manifesta publicamente sobre a importância da abordagem de Gênero e Sexualidade nas escolas. A entidade que tem como missão institucional "estimular o ensino e a pesquisa em Sociologia e desenvolver atividades voltadas ao desenvolvimento das ciências humanas e sociais no país". Na nota, a SBS, mencionou que "considera preocupante a supressão dos temas das relações de gênero e orientação sexual dos planos de educação do país. 

Segue o teor da nota:

NOTA DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE SOCIOLOGIA SOBRE A SUPRESSãO DO ENSINO DE QUESTõES DE GêNERO E ORIENTAçãO SEXUAL NAS ESCOLAS

A Sociedade Brasileira de Sociologia considera preocupante a supressão dos temas das relações de gênero e orientação sexual dos planos de educação nacional, estaduais e municipais. Sem formação sobre eles, os estudantes não terão acesso a conceitos e vocabulário fundamentais para a vida na sociedade contemporânea, marcada pela luta por igualdade entre homens e mulheres e o enriquecedor contato com as diferenças sexuais e de gênero. As discussões sobre gênero e orientação sexual favorecem a compreensão de direitos fundamentais e oferecem embasamento para que pessoas recusem e se protejam do preconceito e da discriminação, contribuindo assim para a construção de uma sociedade mais justa. A exclusão de conteúdos educacionais sobre gênero e sexualidade fere valores republicanos como direito à informação e livre expressão do pensamento, impedindo que que os jovens reflitam sobre desigualdades históricas e possam participar de modo qualificado do aprimoramento da democracia brasileira.
A oposição sistemática e autoritária de alguns ao que chamam de “ideologia de gênero” revela desconhecimento da consolidada produção científica nacional e internacional na área dos estudos de gênero e sexualidade. Gênero é uma categoria analítica que permite compreender e criticar desigualdades históricas entre homens e mulheres, assim como os processos discriminatórios que impedem a livre transitividade de gênero legando pessoas ‘trans’ a uma injusta e inaceitável subcidadania. As investigações sociológicas sobre sexualidade permitiram a compreensão de formas institucionais e cotidianas de discriminação e violência contra homossexuais, o que tem contribuído para a formulação de políticas públicas que visem garantir a esses sujeitos seus direitos humanos.
Impedir o acesso de alunas e alunos às teorias e pesquisas contemporâneas sobre gênero e orientação sexual e a propalada defesa da família proposta por segmentos de grupos de religiosos constitui indisfarçável ato obscurantista de censura ao acesso a informações de indiscutível validade científica. Cabe ressaltar que religiosos, das mais variadas crenças, tem se revoltado contra discriminações e desigualdades baseadas no gênero e na orientação sexual e não apoiam a restrição à propagação de conhecimentos sobre a temática.
Vedar a possibilidade de aprendizado sobre conhecimentos largamente comprovados na ciência contemporânea é uma medida obscurantista, incompatível com objetivos educacionais do país estabelecidos no próprio Plano Nacional de Educação (PNE), projeto de lei que define diretrizes e metas para a educação até 2020, dentre os quais destacamos: superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação; promoção humanística, científica, cultural e tecnológica do país; promoção dos princípios do respeito aos direitos humanos, à diversidade e à sustentabilidade socioambiental. Por essas razões, a Sociedade Brasileira de Sociologia vem a público expressar seu repúdio à supressão da menção às questões de gênero e orientação sexual no referido Plano, bem como a outras iniciativas similares que vem sendo tomadas em unidades da federação brasileira. 

Sociedade Brasileira de Sociologia

Porto Alegre, 19 de junho de 2015.

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Entidades manifestam em favor da igualdade de gênero na Educação

por Frederico Oliveira



A Comissão da Diversidade Sexual e Combate à Homofobia da OAB SP​ em conjunto com a Defensoria Pública de São Paulo​ e outras entidades da comunidade científica e de defesa de direitos humanos, assinam o esclarecedor manifesto elaborado pelo Núcleo de Estudos sobre Marcadores Sociais da Diferença - NUMAS, do Departamento de Antropologia Social da USP. 

O manifesto visa combater a distorção e a campanha difamatória promovida por setores ultraconservadores da sociedade, principalmente fundamentalistas religiosos, que nos últimos dias, tomaram as casas legislativas brasileiras fazendo um verdadeiro cerco contra as políticas de combate ao preconceito e à discriminação inseridas nos planos de educação de âmbito estadual e municipal. 

Distorções e mentiras disseminadas com o uso equivocado do título "ideologia de gênero", vem gerando um pânico social, pois segundo esses propagadores, os objetivos reclamados pelos movimentos sociais de defesa da população LGBT e de direitos humanos seria de promover uma reprogramação de gênero nas crianças, eliminando as diferenças naturais (biológicas) e socialmente construídas para gênero e sexualidade. 

Ao contrário disso, a discussão em torno da sexualidade e de gênero nas escolas têm a finalidade de romper com o ciclo da violência do machismo, da homofobia e da transfobia, fruto da hierarquização de papéis convencionados com base no gênero. Para isso, mister se faz compreender as diferenças relativas à diversidade de orientação sexual e identidade de gênero para o combate da evasão escolar e da repetência de crianças e adolescentes que escapam os padrões heteronormativos, consolidados em torno daquilo que compreendemos como masculino e feminino. 

A luta por uma educação igualitária, inclusiva e de respeito às diferenças, além de cumprir a ordem jurídica vigente, é o caminho para a construção de uma sociedade fraterna, justa, pluralista e SEM PRECONCEITOS, tal como dispõe o preâmbulo da Constituição. 

Afinal de contas, como já escrevi ao tratar de políticas públicas e diversidade sexual, "a escola é um dos principais focos de propagação das discriminações que passam a ser irradiadas nas demais relações de convívio social"1, geradoras da violência, desmotivação, medo e insegurança em crianças e adolescentes que ainda hoje sofrem bullying homofóbico e transfóbico no ambiente escolar. 

1. OLIVEIRA, Frederico Batista de. Políticas Públicas e Diversidade Sexual in SMANIO, Gianpaolo Poggio; BERTOLIN, Patrícia Tuma Martins. O Direito e as Políticas Públicas no Brasil. São Paulo: Atlas, 2013, p. 476/503.

Segue o teor do manifesto:

Manifesto pela igualdade de gênero na educação:
por uma escola democrática, inclusiva e sem censuras.

Enquanto grupos de pesquisas, instituições científicas e de promoção de direitos civis, as instituições abaixo assinadas vêm a público manifestar repúdio à forma deliberadamente distorcida que o conceito de gênero tem sido tratado nas discussões públicas e denunciar a tentativa de grupos conservadores de instaurar um pânico social, banir a noção de “igualdade de gênero” do debate educacional e reificar as desigualdades e violências sofridas por homens e mulheres no espaço escolar.
Signatário dos principais documentos internacionais de promoção da igualdade (como a Convenção Para Eliminar Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher – CEDAW; o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e da Campanha pela igualdade e direitos de população LGBT da ONU), o Brasil acompanhou a institucionalização dos estudos de gênero enquanto um profícuo campo científico nas últimas décadas e conta hoje com centros de pesquisas interdisciplinares reconhecidos internacionalmente. As discussões de gênero ganharam legitimidade científica nas maiores universidades brasileiras a partir dos anos 1970 e, desde então, têm norteado políticas públicas para garantia de igualdades constitucionais.
Ao contrário de “ideologias” ou “doutrinas” sustentadas pela fundamentação de crenças ou fé, o conceito de gênero está baseado em parâmetros científicos de produção de saberes sobre o mundo. Gênero, enquanto um conceito, identifica processos históricos e culturais que classificam e posicionam as pessoas a partir de uma relação sobre o que é entendido como feminino e masculino. É um operador que cria sentido para as diferenças percebidas em nossos corpos e articula pessoas, emoções, práticas e coisas dentro de uma estrutura de poder. E é, nesse sentido, que o conceito de gênero tem sido historicamente útil para que muitas pesquisas consigam identificar mecanismos de reprodução de desigualdades no contexto escolar.
Embora a Constituição Federal Brasileira de 1988 garanta, em seu Artigo 6º, que a Educação é um direito irrevogável de todas e todos e assegure a igualdade de condições para acesso e permanência escolar, pesquisas mostram que esse direito é constantemente violado a partir das estruturas hierárquicas de gênero. Um exemplo de como a desigualdade de gênero se correlaciona com a educação tem sido visto em pesquisas que identificam o “fracasso” e as altas taxas de evasão escolar dos meninos como consequência dos referenciais de masculinidades difundidos socialmente. Uma identidade masculina baseada na agressividade e na indisciplina tem cada vez mais afastado os meninos dos bancos escolares (37,9% deles segundo dados do IBGE em 2011), negando-lhes seu direito à educação e reproduzindo uma cultura da violência. Professoras são vítimas de agressões em sala de aula, meninas são estupradas por seus colegas de turma e meninos são afastados das escolas neste ciclo de desigualdade perpetuado por noções hierarquizadas do que é ser homem ou mulher. Também são notáveis, por outro lado, as pesquisas que mostram o quanto a discriminação de gênero contra as pessoas que fogem dos padrões socialmente estabelecidos de identidade ou sexualidade tem desencadeado processos institucionalizados de discriminação, agressões e exclusão escolar: as violências contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis, mulheres transexuais e homens trans excluem essa população do direito constitucional à educação e contribuem para as estatísticas que fazem do Brasil um dos países mais inseguros para pessoas LGBT (conforme demonstra o relatório do Grupo Gay da Bahia de 2012 e o relatório de violência homofóbica da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República).
Quando se reivindica, então, a noção de “igualdade de gênero” na educação, a demanda é por um sistema escolar inclusivo, que crie ações específicas de combate às discriminações e que não contribua para a reprodução das desigualdades que persistem em nossa sociedade. Falar em uma educação que promova a igualdade de gênero, entretanto, não significa anular as diferenças percebidas entre as pessoas (o que tem sido amplamente distorcido no debate público), mas garantir um espaço democrático onde tais diferenças não se desdobrem em desigualdades. Exigimos que o direito à educação seja garantido a qualquer cidadã ou cidadão brasileira/o e, para isso, políticas de combate às desigualdades de gênero precisam ser implementadas.
Além disso, é preciso ainda ressaltar que, acima das negociações legislativas locais, a Constituição Nacional Brasileira de 1988 estabelece também que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença” e o ensino deve estar baseado no princípio de liberdade de divulgação do pensamento e do pluralismo de ideias. Assim, não cabe às esferas locais de decisão realizar ocultamentos, censuras ou proibições de discussões reconhecidas no campo científico e, muito menos, a imposição de uma visão de mundo delimitadora nos currículos escolares. Em defesa do pluralismo de saberes e do reconhecimento do campo científico nacional e internacional, defendemos que é um direito fundamental das/os estudantes brasileiras/os o acesso aos conhecimentos e pesquisas produzidos pelos estudos interdisciplinares sobre o conceito de gênero. Nossa defesa é por uma educação democrática, inclusiva e, também, que repudie qualquer forma de censura.
Assinam:
ABA - Associação Brasileira de Antropologia
ABEH Associação Brasileira de Estudos da Homocultura
CEM - Centro de Estudos da Metrópole - USP e CEBRAP/São Paulo
Centro Acadêmico de Serviço Social - UNIOESTE/Paraná
CLAM – Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos – UERJ/ Rio de Janeiro
Colegiado do Curso de Ciêncais Sociais da UNIOESTE - Campus de Toledo/ Paraná
Coletivo ASA - Artes, Saberes e Antropologia  - USP/São Paulo
Coletivo Feminista Filhas da Luta - UNIPAMPA/ Rio Grande do Sul
Comissão da Diversidade Sexual e Combate a Homofobia da OAB/ São Paulo
Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia
Comissão de Diversidade Sexual da OAB/ Paraná
Comissão de Estudos sobre Violência de Gênero da OAB/ Paraná
COMTER – Núcleo de estudos sobre memória e conflitos territoriais - UFC / Ceará
Conselho Regional de Psicologia da 3ª Região Bahia
Curso Técnico em segurança do Trabalho do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais – IFMG (Unidade Remota, Ijací) / Minas Gerais
CUS - Grupo de Pesquisa em Cultura e Sexualidade – UFBA/ Bahia
Demodê – Grupo de Pesquisas sobre Democracia e Desigualdades UnB/ Distrito Federal
Diversiones - Direitos humanos, poder e cultura em gênero e sexualidade – UFPE/ Pernambuco
Edges – Grupo de Estudos de Gênero, Educação e Cultura Sexual – USP/ São Paulo
Enlace - UNEB/Bahia
FAGES – Núcleo de Família Gênero e Sexualidade – UFPE/ Pernambuco
Focus - Grupo de Pesquisa sobre Educação, Instituições e Desigualdades - UNICAMP/São Paulo
GADvS - Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero
GEERGE – Grupo de Estudos em Educação e Relações de Gênero - UFRGS/ Rio Grande do Sul
GEM - Centro de Estudos e Pesquisas sobre mulheres, gênero, saúde e enfermagem - UFBA
GEMA – Núcleo de Pesquisa em Gênero e Masculinidade – UFPE/ Pernambuco
Gênero, Corporalidades, Direitos Humanos e Políticas Públicas – UEL/ Paraná
Geni - Grupo de Estudos em Gênero, Sexualidade e Interseccionalidades – UERJ/ Rio de Janeiro
GEPEM - Grupo de Estudos e Pesquisas “Eneida de Moraes” – UFPA/ Pará
GEPS - Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Sexualidades – UNESP/ São Paulo
GERA - Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Formação de Professores e Relações Étnico-Raciais – UFPA/ Pará
GESECS -Grupo de Estudos e Pesquisas em Gênero, Sexualidades e Interseccionalidades – UFAM/ Amazonas
GETEPOL - Grupo Estudos em Teoria Política - UEL/Paraná
GIV – Grupo de Incentivo à Vida/ São Paulo
GPLutas – Grupo de Pesquisa Marxismo, Direito e Lutas Sociais – UFPB/ Paraíba
GRUPESC -Grupo de Pesquisa Saúde, Sociedade e Cultura – UFPB/ Paraíba
Grupo Arco-Iris de Cidadania LGBT/Rio de Janeiro
Grupo de estudos “Campo educacional e o estudo das categorias interseccionais” / Núcleo de Estudos e Pesquisas em Direitos Humanos , Bioética e Educação - UFF/ Rio de Janeiro
Grupo de Estudos e Pesquisa em Gênero e Sexualidades – UESB/ Bahia
Grupo de Estudos em Saúde Coletiva, Educação e Relações de Gênero -EACH -USP/ São Paulo
Grupo de Estudos Gênero, Direitos Humanos, Raça/Etnia – Fundação Carlos Chagas
Grupo de pesquisa "Legado intelectual e produção literária de autoria feminina na América Latina" – UEL/Paraná
Grupo de Pesquisa (R)existências e metaquestões dos marcadores de diferença - UEL/Paraná
Grupo de pesquisa Cidade, Aldeia e Patrimônio – UFPA / Pará
Grupo de Pesquisa e Intervenção Violência e gênero nas práticas de saúde – FMUSP/ São Paulo
Grupo de Pesquisa em Sexualidade, Entretenimento e Corpo - UFSCar/ São Paulo
Grupo de Pesquisa Fundamentos do Serviço Social: Trabalho e "Questão Social" - UNIOESTE/ Paraná
Grupo de pesquisa- Gênero, Políticas Públicas Família – UEL/ Paraná
Grupo de Pesquisa Saúde, Sexualidade e Direitos Humanos da População LGBT - FCMSCSP/ São Paulo
Grupo de Pesquisa Representação, Imaginário e Educação - UFF/ Rio de Janeiro
Grupo de Pesquisas “Trilhas do empoderamento de Mulheres” / NEIM - Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a mulher – UFBA/ Bahia
Grupo Humanidades e Saúde Coletiva – FMUSP/ São Paulo
Grupo Transas do Corpo - Ações Educativas em Gênero, Saúde e Sexualidade
ILADH - Instituto Latino Americano de Direitos Humanos
Impróprias - Grupo de pesquisa em gênero, sexualidade e diferenças – UFMS/ Mato Grosso do Sul
Instituto de Estudos de Gênero – UFSC/ Santa Catarina 
Instituto Patrícia Galvão-Mídia e Direitos / São Paulo
Laboratório de Estudos de História – UFSC/ Santa Catarina
Laboratório de Experimentações Etnográficas – UFSCar/ São Paulo
Laboratório de Relações de Gênero e Família do Centro de Ciências Humanas e da Educação – UDESC/ Santa Catarina
Laboratório do Núcleo de Antropologia Urbana – USP/ São Paulo
Laboratório Genposs - Gênero, Serviços Sociais, e Política Social – UnB / Distrito Federal
Laboratório Interdisciplinar de Ciências Humanas, Sociais e Saúde – Unifesp/ São Paulo
LAPEE – Laboratório de Psicologia Escolar e Educacional – UFSC/ Santa Catarina
LAPPEL – Laboratório de pesquisa em psicanálise, epistemologia e linguagem – UFMS/ Mato Grosso do Sul
LEFAM – Laboratório de Estudos da Família, Relações de Gênero e Sexualidade – USP/ São Paulo
LIDIS - Laboratório Integrado em Diversidade Sexual e de Gênero, Políticas e Direitos da UERJ
Mandacaru - Núcleo de Pesquisas em Gênero, Saúde e Direitos Humanos – UFAL/ Alagoas
Movimento "Jesus cura a homofobia"
NaMargem -  Núcleo de Pesquisas Urbanas - UFSCar/São Paulo
NEIM – Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher – UFBA/ Bahia
NEPAIDS – Nucleo de Estudos para a Prevenção da AIDS – USP/ São Paulo
NEPJI - Nucleo de estudos e pesquisas sobre Juventude, Cultura, Identidade e Cidadania - UCSal/ Bahia
NEPTA - Núcleo de Estudos de Políticas Territoriais na Amazônia -UFAM/ Amazonas
NIGS - Nucleo de Gênero e Subjetividade – UFSC/ Santa Catarina
Nós do Sul: Laboratório de Estudos e Pesquisas Sobre Currículo - FURG/ Rio Grande do Sul
Nucleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT – UFMG/ Minas Gerais
Núcleo de Estudos de Gênero – UFPR/ Paraná
Núcleo de Estudos de Sexualidade e Gênero – UFRJ/ Rio de Janeiro
Núcleo de Estudos Heleieth Saffioti – UNIFESP/ São Paulo
Núcleo de Estudos, Pesquisas e Extensão em Sexualidade, Corporalidades e Direitos - UFT/ Tocantins
Núcleo de Pesquisa  Gênero Corpo Sexualidade - UFRN/ Rio Grande do Norte
Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública do Estado de São Paulo
Núcleo Especializado de Combate à Discriminação, Racismo e Preconceito da Defensoria Pública do Estado de São Paulo
Núcleo Margens: modos de vida, família e relações de gênero – UFSC/ Santa Catarina
NUDISEX - Núcleo de Estudos e Pesquisas em Diversidade Sexual - UEM/Paraná
NUMAS – Núcleo de Estudos sobre Marcadores Sociais da Diferença da USP/Sâo Paulo
NUPSEX – Núcleo de Pesquisa em Sexualidade e Relações de Gênero – UFRGS/ Rio Grande do Sul
NuSEX – Núcleo de estudos em Corpos, Genero e Sexualidades – Museu Nacional/ Rio de Janeiro
NUSS - Núcleo de Pesquisas sobre Sexualidade, Gênero e Subjetividade - UFC/ Ceará
Observatório da Violência de Gênero no Amazonas - UfAM/ Amazonas
OPEM - Grupo de Pesquisa Observatório de Pesquisas e Estudos Multidisciplinares - UEPB/ Paraíba
Pagu – Núcleo de Estudos de Gênero – Unicamp/ São Paulo
Programa de Pós-Graduação em Serviço Social – ONIOESTE (Campus de Toledo)/ Paraná
Quereres - Núcleo de Pesquisa em Diferenças, Gênero e Sexualidade – UFSCar/ São Paulo 
RIZOMA - UEFS/ Bahia
RUMA - Grupo População, família e migração na Amazônia - UFPA/Pará
Ser-Tão, Núcleo de Estudos e Pesquisas em Gênero e Sexualidade - UFG/ Goiás
SEXGEN – Grupo de Pesquisa Corpo, Gênero e Sexualidade – UFPA/ Pará
Sociedade Brasileira de Sociologia

VIOLAR - Laboratório de Estudos sobre Violência, Cultura e Juventude da Unicamp/ São Paulo



terça-feira, 24 de março de 2015

Tribunal Regional do Trabalho de MT aprova logomarca para Campanha de Diversidade e Inclusão

Notícias TRT23
publicado em 13/02/2015

TRT/MT
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Foi aprovado o símbolo gráfico que representará as iniciativas de respeito às minorias que serão desenvolvidas pela Justiça do Trabalho em Mato Grosso. A logomarca foi escolhida pela Comissão da Diversidade, instituída no último dia 26 de janeiro pelo TRT mato-grossense para traçar diretrizes que farão parte da Política Institucional da Diversidade e Inclusão e assim promover ações de combate à discriminação.
A logo eleita é uma árvore que reúne diferentes mãos coloridas, representando os vários grupos sociais que ainda convivem com a discriminação e a exclusão. O símbolo representa a união destas minorias aos demais “frutos e galhos” do arbusto, numa situação de igualdade de direitos, respeitando as diferenças individuais de cada um.
Mulheres, negros, homossexuais, indígenas, pessoas com deficiência e obesos são alguns dos grupos que ainda sofrem com o preconceito.
A medida leva em consideração não apenas o princípio da igualdade e da vedação à discriminação estabelecido na Constituição brasileira, como também ocorre de forma alinhada à missão do Tribunal de promover ações afirmativas, bem como dos objetivos estratégicos de valorização da qualidade de vida e das pessoas.
Além da instituição de uma política interna, a perspectiva é promover ações voltadas à conscientização quanto às diversidades, sejam elas de gênero, cultural, de religião, de orientação sexual, entre outras, bem como valorização das minorias existentes, por meio de campanhas publicitárias e educativas.
Pesquisa
Ainda este mês, a Comissão da Diversidade lançará uma pesquisa de levantamento com o público interno sobre casos de preconceitos nas unidades do TRT. Os dados da pesquisa servirão como base para a definição de projetos futuros.
Fazem parte da Comissão de Diversidade e Inclusão, os juízes Deizimar Oliveira e Plínio Podolan e os servidores Nelson Ferraz (Coordenadoria de Comunicação Social), Letícia Borges (Núcleo de Saúde e Qualidade de Vida), Nadir Miranda (Secretaria de Gestão de Pessoas), Regianne Oliveira (2ª Vara de Tangará) e Estela Tiveron (7ª Vara).

Fonte: TRT23

quarta-feira, 11 de março de 2015

OAB/SP manifesta repúdio ao Estatuto da Família que discrimina famílias homoafetivas

por Frederico Oliveira


A Ordem dos Advogados do Brasil, Secional São Paulo, por meio da Comissão da Diversidade Sexual e Combate à Homofobia publicou (10/03) NOTA DE REPÚDIO manifestando-se contrária ao projeto de lei em trâmite na Câmara dos Deputados, denominado Estatuto da Família (PL 6583/2013). Referido projeto de autoria da bancada fundamentalista religiosa, da Frente Parlamentar Evangélica tem o claro propósito de discriminar outros arranjos familiares que não se enquadram no modelo heteronormativo, em especial as famílias homoafetivas. 

Não bastasse isso, o projeto visa a proibição da adoção por casais homossexuais (substitutivo proposto pelo Deputado Ronaldo Fonseca, PROS/DF), bem como criar um Conselho da Família, além da trágica ideia de se prever uma disciplina no ensino básico denominada de "Educação para a família", colocando para a escola um papel que cabe exclusivamente aos pais tomar partido. 

A manifestação se deu após o lamentável episódio de violência homofóbica que vitimou um adolescente de 14 anos na cidade de Ferraz de Vasconcelos que faleceu (09/03) após ter sido agredido por colegas de escola pelo simples fato de ser filho de um casal homossexual.  

Como bem salientou a CDSCH da OAB/SP o Estado tem a obrigação de zelar pela igualdade jurídica conquistada por um longo processo de luta dessa parcela da população, vítima de um profundo preconceito enraizado no seio de nossa sociedade. Nesse sentido, esperamos contar com o apoio da sociedade civil organizada para que possamos refletir um direito inclusivo que acolha todos os arranjos familiares, para que todos os indivíduos, independente do modelo familiar a que pertença, possam crescer e se desenvolver plenamente livres de estereótipos e preconceitos tão prejudiciais para o bem estar e para a integridade física e psicológica das pessoas LGBT.   

Segue a íntegra da nota de repúdio: 


A Comissão da Diversidade Sexual e Combate à Homofobia da OAB SP, vem a público manifestar REPÚDIO ao lamentável episódio que vitimou um adolescente de 14 anos no município de Ferraz de Vasconcelos, região metropolitana de São Paulo. Conforme noticiado, o adolescente faleceu em razão de um aneurisma cerebral, após ter sido vítima de bullying homofóbico praticado na manhã de quinta-feira (5/03/2015) por colegas de escola, na Vila Jamil. De acordo com as notícias há suspeitas de que o garoto foi agredido pelo fato de seus pais serem homossexuais.

Nossa posição é contraria a projetos de lei, a exemplo do denominado Estatuto da Família em tramitação na Câmara dos Deputados, que define como família apenas aquela formada a partir da união entre um homem e uma mulher, com o propósito de discriminar outros arranjos familiares que não se enquadram no modelo heteronormativo, em especial as famílias homoafetivas.

Afirmamos que a liberdade de constituição da família homoafetiva é um direito conquistado após anos de luta pela igualdade jurídica e o Estado tem a obrigação de garantir e assegurar o cumprimento deste dever, além de fiscalizar, coibir e punir toda e qualquer manifestação que cause violência física/psíquica a pessoas LGBT, incluindo a própria família como no caso acima relatado.

Reafirmamos o compromisso da atuação da Comissão da Diversidade Sexual e Combate a Homofobia da OAB/SP na defesa e promoção dos direitos da população LGBT, lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais a fim de lutar contra qualquer forma de discriminação e violência. É inadmissível condutas de tamanha crueldade e violência no ambiente escolar, espaço onde deveria prevalecer a segurança e principalmente o respeito à diversidade cultural, social, política, sexual e em particular o respeito a todas as formas de constituição familiar.

São Paulo, 10 de março de 2015.


Comissão da Diversidade Sexual e Combate a Homofobia da OAB/SP.




segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

O Direito e a construção da cidadania das pessoas trans: a constitucionalização e o respeito às normas internacionais de direitos humanos

por Frederico Oliveira
trecho de artigo publicado em 06/10/2014 (adaptado)


No campo do Direito, sem discutir qual corrente é majoritária, mesmo porque não é esse o ponto da minha discussão, a questão da cidadania das pessoas travestis e transexuais é controvertida. Primeiramente porque não há lei que retire os obstáculos do senso comum e da compreensão ultrapassada da medicina, obstáculos que entendo ser altamente prejudiciais por negarem o direito natural à identidade de gênero. 

A Lei de Registro Públicos, instituída numa visão limitada de imutabilidade do prenome, é quase uma norma de proibição de retificação do registro civil. 

A afirmação de direitos especifícos às minorias, no caso as travestis e transexuais, não significa dar ou conceder privilégios, mas reconhecê-las em sua plenitude para que possam ser retiradas da condição de rebaixamento, fruto de uma moral acrítica e de uma tradição histórica divorciada da realidade, fundada na ideia de dominação. Para que as minorias possam ser reconhecidas, é preciso ser fomentada a conciliação da distribuição de direitos com o reconhecimento da identidade cultural ou social dos indivíduos que a elas integram. [1]

A falta de reconhecimento promove a depreciação das identidades que ficam vulneráveis à manipulação das opiniões públicas e vitimadas pela opressão da maioria integrante do padrão socialmente imposto. Desse modo, para se colmatar uma justa distribuição de direitos é indispensável a promoção do reconhecimento dessas identidades para que essas minorias possam também exercer uma cidadania plena, livres do rebaixamento e da opressão dos padrões sociais que não se encaixam na realidade desses indivíduos. Isso ocorre, pois a válvula motora da condição de rebaixamento desses grupos foi construída com a propagação de uma cultura não reflexiva a respeito da pluralidade de identidades sociais e culturais que circunda a essência humana. 

Numa concepção de cidadania, não se admite a inferiorização de alguns em detrimento de outros, muito menos a falta de acesso a direitos tão essenciais ao exercício de uma ideal cidadania, calcada na fruição de direitos fundamentais. 

O sentido de uma democracia como regime político, deve ser fundado na cidadania para todos, como base para o exercício dos poderes constituídos pelo Estado, conciliando-se os princípios da liberdade, da igualdade, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana. Um regime assim estabelecido impõe um olhar especial que possa corrigir as vulnerabilidades de certas pessoas que, por sua condição - aqui no caso de identidade de gênero - não tem garantida uma justa participação na distribuição dos direitos fundamentais.   

O reconhecimento e a apropriação da concepção de cidadania é de suma importância para uma justiça pautada na distribuição equitativa dos benefícios. As pessoas travestis e transexuais são estigmatizadas pela sociedade e tais estigmas são frutos da sedimentação de um padrão tradicional e histórico. 

As pessoas trans sofrem pela “usurpação negativa de um bem imaterial”, pois não há aceitação e respeito à sua condição diferente dos padrões convencionais estabelecidos pela sociedade. Por essa razão, cabe ao Direito equilibrar as distorções a fim de se promover o reconhecimento pleno da identidade de gênero dessas pessoas.[2]

Elas “precisam se saber reconhecid[a]os também em suas capacidades e propriedades particulares para estar em condições de autorrealização, el[a]es necessitam de uma estima social que só pode se dar na base de finalidades partilhadas em comum.[3]

No plano internacional de Direitos Humanos a compreensão a respeito da cidadania das pessoas LGBTs é orientada pelos Princípios de Yogyakarta que reputa a identidade de gênero como essencial para “a dignidade e humanidade de cada pessoa”.  

O referido documento integrante dos tratados internacionais em que o Brasil é signatário, estabelece como identidade de gênero “a profundamente sentida experiência interna e individual do gênero de cada pessoa, que pode ou não corresponder ao sexo atribuído no nascimento, incluindo o senso pessoal do corpo (que pode envolver, por livre escolha, modificação da aparência ou função corporal por meios médicos, cirúrgicos ou outros) e outras expressões de gênero, inclusive vestimenta, modo de falar e maneirismos.” 

A orientação sexual e identidade de gênero autodefinidas por cada pessoa constituem parte essencial de sua personalidade e um dos aspectos mais básicos de sua autodeterminação, dignidade e liberdade.” (destaquei)

Além dessa interpretação, os Princípios de Yogyakarta determinam que os Estados-partes, como é o caso do Brasil deverão: 

“a) Garantir que todas as pessoas tenham capacidade jurídica em assuntos cíveis, sem discriminação por motivo de orientação sexual ou identidade de gênero, assim como a oportunidade de exercer esta capacidade, inclusive direitos iguais para celebrar contratos, administrar, ter a posse, adquirir (inclusive por meio de herança), gerenciar, desfrutar e dispor de propriedade; b) Tomar todas as medidas legislativas, administrativas e de outros tipos que sejam necessárias para respeitar plenamente e reconhecer legalmente a identidade de gênero autodefinida por cada pessoa; c) Tomar todas as medidas legislativas, administrativas e de outros tipos que sejam necessárias para que existam procedimentos pelos quais todos os documentos de identidade emitidos pelo Estado que indiquem o sexo/gênero da pessoa – incluindo certificados de nascimento, passaportes, registros eleitorais e outros documentos – reflitam a profunda identidade de gênero autodefinida por cada pessoa; d) Assegurar que esses procedimentos sejam eficientes, justos e não-discriminatórios e que respeitem a dignidade e privacidade das pessoas; e) Garantir que mudanças em documentos de identidade sejam reconhecidas em todas as situações em que a identificação ou desagregação das pessoas por gênero seja exigida por lei ou por políticas públicas;” (destaquei) 

No dia 26/09, o Conselho de Direitos Humanos (29a Sessão) do sistema global (ONU), com participação efetiva do Estado Brasileiro, editou uma resolução expressando uma grave preocupação com os atos de violência e discriminação contra as pessoas LGBT, determinando ao Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos (ACNUDH) o monitoramento dessa violência para orientar boas práticas para a sua superação.

A nossa ordem constitucional recepciona os tratados internacionais ratificados pelo Brasil no seu ambito doméstico (art. 5º, § 3º) - tal como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e o Pacto de Direitos Econômicos Sociais e Culturais - que nas questões de orientação sexual e identidade de gênero, devem serem interpretados à luz dos Princípios de Yogyakarta. As normas internacionais de direitos humanos, são reconhecidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) com hierarquia supra-legal, atendendo e ampliando os direitos fundamentais consignados na Constituição Brasileira.

Dentre esses princípios temos, em primeiro lugar, a LIBERDADE, considerada pela auto-determinação do indivíduo e pela autonomia da vontade para dirigir a sua vida privada; a IGUALDADE e a DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA que consistem necessariamente “na eliminação de qualquer vestígio de discriminação até a extensão e ampliação dos direitos sociais previstos na Constituição” [4] 

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendimento firmado no sentido de que:

“Para o [a] transexual, ter uma vida digna importa em ver reconhecida a sua identidade sexual, sob a ótica psicossocial, a refletir a verdade real por ele vivenciada e que se reflete na sociedade”, donde “afirmar a dignidade humana significa para cada um manifestar sua verdadeira identidade, o que inclui o reconhecimento da real identidade sexual, em respeito à pessoa humana como valor absoluto” (STJ, REsp n.o 1.008.398/SP, DJe de 18.11.2009)


Não bastasse isso, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ao tentar transversalizar o conhecimento a respeito de gênero e sexualidade, na I Jornada de Direito à Saúde, editou os seguintes enunciados:

Enunciado 42. Quando comprovado o desejo de viver e ser aceito enquanto pessoa do sexo oposto, resultando numa incongruência entre a identidade determinada pela anatomia de nascimento e a identidade sentida, a cirurgia de transgenitalização é dispensável para a retificação de nome no registro civil. 
Enunciado 43. É possível a retificação do sexo jurídico sem a realização da cirurgia de transgenitalização."

O direito à identidade integra os direitos da personalidade, tratando-se de direitos subjetivos inatos e absolutos aos quais não cabe a ninguém, muito menos ao Estado restringir. Esse direito independe, inclusive, de autorização, cabendo o reconhecimento da sociedade e ao Estado propiciar os meios para que as pessoas possam se apresentar da forma que melhor se identificam. 

Muitos estados e municípios, mesmo diante de suas limitaçoes, (pois cabe à União legislar sobre direito civil), já garantem o reconhecimento à identidade das pessoas trans pelo denominado NOME SOCIAL que aproxima os documentos dessas pessoas à sua realidade de vida em sociedade. Esse reconhecimento também vem sendo estendido às escolas e universidades públicas. 

Infelizmente quando o Judiciário nega direitos das pessoas trans, ele o faz na grande maioria das vezes sob a justificativa da MEDICINA ou de lacuna da lei. Em todas essas hipóteses, o faz contrariando a nossa ordem constituicional que garante cidadania plena para todos indistintamente. 

É preciso, pois promover a devida constituicionalização do direito em observância à nossa ordem convencional (dos tratados internacionais de direitos humanos) e de direitos fundamentais, garantindo-se, pois, a ideal força normativa dos princípios constitucionais de eficácia plena e de aplicação imediata (art. 5º, § 1º) que, obrigatoriamente devem preencher a lacuna legislativa para a concretização da dignidade das pessoas transexuais. 

Cabe nesse sentido, romper com as metologias interpretativas dogmáticas que se colocam como obstáculo para a fruição plena dos direitos fundamentais. Para isso, é necessária a utilização de uma metodologia apta a concretizar os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da liberdade para devolver humanidade às pessoas travestis e transexuais.

O Direito no Brasil não vem fazendo o esforço para a transversalização dos estudos mais recentes da psicologia e das ciências sociais que são muito mais relevantes e adequados, do que a medicina para determinar o conhecimento doutrinário. 

A questão identitária das pessoas trans encontra-se próxima de ser decidida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em ação direta de inconstitucionalidade ADI 4275, de autoria da Procuradoria Geral da República, tendo ingressado como amici curiae o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), o Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual (GADvS) e a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Trangêneros (ABGLT), além da repercussao geral reconhecida pela suprema corte no RE 670.422

Agora proponho a seguinte reflexão: se mesmo diante todos esses sólidos estudos em torno da compreensão da identidade de gênero, o juiz insiste em um laudo psicológico para atestar a condição da transexualidade ou atrela a retificação do registro civil à cirurgia de transgenitalização, ele demonstra, no mínimo, preguiça de avaliar a realidade identitária vivida por aquela que demanda a retificação de registro, o que pode ser facilmente constatado por prova documental e testemunhal. Além disso, demonstra um total menosprezo com o sofrimento vivido por uma pessoa que passa a ter sua identidade civil depondo contra a sua realidade social aumentando a situação de marginalidade e discriminação enfrentada por essas pessoas. 

Para Paulo Bonavides: “O Direito ou liberta ou não é Direito. Não lhe reconhecemos outra função, outra filosofia, outro escopo, outra validez. Não importa discutir-lhe a origem, mas o fim; o fim da concretude social contemporânea, sobretudo quando se atenta que aí já baixam sombras espessas sobre o futuro da liberdade e o destino dos povos. Aquele fim é a vocação das Constituições. Não podem elas, (…) apartar-se, por conseguinte, do constitucionalismo dirigente, vinculante, pragmatico. Fazê-lo seria condená-las à ineficácia, à obsolescência, à fatalidade, desatando-as de seus laços com o Estado social.” [5]

A leitura isolada do artigo 13 do Código Civil, distante da compreensão das questões reais enfrentadas pelas transexuais não pode servir de obstáculo para aprisiona-las em seu próprio corpo. A funcionalidade da sexualidade não se limita a um órgão sexual, não podendo a cirurgia de transgenitalização ser percebida como “diminuição permanente da integridade física”, sobretudo quando a própria medicina apresenta técnicas reconhecidas com sucesso para se manter a funcionalidade do órgão sexual redesignado de pênis para a “neovagina”, não se tratando mais de procedimento experimental (a transgenitalização de transexuais masculinos, por outro lado, referente a neofaloplastia ainda é considerada pelo CFM como cirurgia experimental) - cf. Parecer CFM 20/10

É preciso promover a constitucionalização do Direito que, sob a ótica da dignidade humana, deve garantir a liberdade dessas pessoas realizarem as mudanças necessárias em seu corpo para o alcance da felicidade na sua conformação identitária. 

As regras não podem ser interpretadas como obstáculo para a concretização dos princípios que visem a plenitude de vida do ser humano, sob pena de se fazer o uso do Direito como instrumento de dominação e de opressão.

[1] FRASER, Nancy. Reconhecimento sem Ética? Revista Lua Nova, São Paulo 70: 101-138, 2007, p. 106.  
[2] LOPES, José Reinaldo de Lima. O direito ao reconhecimento para gays e lésbicas. Sur, Revista Internacional de Direitos Humanos. SP. v. 2. n. 2, 2005. 

[3] apesar de tratar de pessoas o sociólogo alemão enfrenta a luta pelo reconhecimento das minorias in HONNETH, Axel. Luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais. Tradução Luiz Repa. São Paulo: Editora 34, 2003, p. 277. 
[4] APPIO, Eduardo. Direito das minorias. SP: RT, p. 197
[5] BONAVIDES, Paulo. Teoria constitucional da democracia participativa. SP: Malheiros, 2001.